Grandes cidades investem em rede própria e cobram mais ousadia das teles

10 de julho de 2012 - 17:08

 

A necessidade de investimento em infraestrutura decorre de um conjunto de fatores, que engloba da falta de oferta a qualidade insuficiente do serviço e preço elevado.

Todas as cidades classificadas nas dez primeiras posições do Índice Brasil de Cidades Digitais lançado esta semana em São Paulo pela Momento Editorial em parceria com o CPqD, contam com rede própria de telecomunicações, ou em parceria com a Rede Nacional de Pesquisa. E todas elas preveem investimentos em 2012 para continuar a investir em infraestrutura própria.

Quais são as razões que levam as prefeituras das capitais e grandes cidades a realizar investimentos em rede se, nas grandes cidades, há um aumento da competição e da oferta das operadoras de telecomunicações? De acordo com os gestores responsáveis pelas redes próprias de telecomunicações – a maioria delas híbrida, combinando fibra óptica e soluções wireless –, a necessidade de investimento em infraestrutura decorre de um conjunto de fatores: falta de oferta (cobertura insuficiente dos serviços das operadoras, mesmo das concessionárias), qualidade insuficiente do serviço e preço elevado. “Não existe um único fator, é uma soma”, comenta Pedro Jaime Ziller de Araujo, presidente da IMA, a empresa de TICs de Campinas (SP), que administra uma rede híbrida de mais de 200 quilômetros de fibra, complementada por transmissão via rádio em 3,4 GHz e por hotspots, estes usados para abrir o sinal para as comunidades do entorno de postos de saúde e escolas.

Campinas, como as demais cidades que lideram o ranking do IBCD 2012, construiu sua rede para atender aos pontos públicos onde as redes das operadoras não chegavam, ou chegavam com velocidade de conexão abaixo das necessidades da prefeitura. “Nós construímos infraestrutura onde não há oferta comercial compatível com nossa demanda. Onde há oferta, contratamos da iniciativa privada”, diz Ziller, que reviu todos os contratos e estabeleceu níveis mais rígidos de qualidade de serviço (QOS). Entre seus fornecedores estão Claro, Telefônica/Vivo, Intelig, CTBC Telecom e Sigmanet. A mesma lógica segue Belo Horizonte, com uma rede híbrida de 211 quilômetros de fibra óptica, complementada por enlaces que usam as tecnologias WiMAX, Wi-Fi e 3G.

Falta parceria

Mas Ziller, que diz manter uma boa relação com as operadoras,  acha que elas deviam ser mais agressivas, e investir para criar mercado. “Mesmo em bairros que não são periféricos nem sempre há oferta de qualidade”, pondera. Sua avaliação conta com o endosso de Franklin Dias Coelho, secretário de Ciência e Tecnologia do município do Rio de Janeiro, que até o final do ano terá uma rede de 256 quilômetros de fibra com enlaces de radiofrequência. Toda a parte de fibra é uma parceria com a RNP, na Recomep (rede metropolitana da RNP). Franklin observa que, no caso das grandes cidades, as operadoras estão muito focadas no dia a dia e não planejam os investimentos na infraestrutura com visão de futuro. “Além disso, negociamos com gerentes que estão muito distantes do centro de decisão das operadoras”, observa ele.

Essa “miopia” das operadoras também incomoda André Kulczynski, presidente da Procempa, a primeira das capitais a investir em rede própria, no final dos anos 1990. O problema, diz Kulczynski, não está apenas na falta de capilaridade ou na baixa velocidade onde o serviço chega, o que obriga a Procempa a investir continuamente na expansão de sua rede de 800 quilômetros de fibra completados por transmissão via rádio ponto-multiponto e que agora vai ganhar também uma rede WiMAX. “Acho que as operadoras dão pouca atenção ao cliente corporativo público. E não estou falando só de cobertura, de estender a rede para pontos periféricos, onde o retorno é baixo. Estou falando na criação de novos serviços para atender a novas demandas. Os municípios precisam de conexão em nuvem para evoluir seus serviços. Eles não tem como criar isso, nem dinheiro nem gestão. Estão aguardando que as operadoras inovem nessa direção”, conta Kulczynski.

No caso específico de Porto Alegre, onde a Procempa é uma espelhinho que também provê todo o serviço de voz fixa para as unidades da Prefeitura (as operadoras recebem o tráfego dentro do prédio da Procempa, onde têm link E1), a demanda agora é digitalizar os processos de execução fiscal da Procuradoria do Município. “No lugar dos procuradores irem à Justiça com um carrinho carregado de processos, vão levar um dispositivo móvel com os processos. Mas por motivo de segurança, esses processos não devem estar em um pen drive, tablet ou outro dispositivo. É mais seguro que estejam na nuvem”, relata o presidente da Procempa, às voltas com seu mais novo projeto.

Como Porto Alegre, também Curitiba tem uma rede própria de grande extensão: são 1078 quilômetros de fibra óptica, 50 deles em parceria com a RNP. Mesmo com uma rede bastante capilarizada, Curitiba ainda precisa utilizar a infraestrutura das operadoras. “Fazemos isso quando é necessário e interessante”, observa Renato Rodrigues, diretor-presidente do Instituto Curitiba de Informática (ICI). No caso, o ICI recorreu à rede 3G das celulares para desenvolver o projeto Monitoramento da Rede Integrada de Transporte Coletivo (RIT), que fornece posição, velocidade e número de passageiros de cada ônibus em tempo real. Os dados são atualizados a cada cinco segundos para os mais de 2.300 pontos de monitoramento (estações, terminais e os próprios veículos da frota). “Pela importância e relevância do projeto, as operadoras se organizaram no sentido de minimizar áreas de sombreamento da cidade”, conta Rodrigues.

Qualidade e preço também interferem

A deficiência na cobertura é certamente o principal motivo que tem levado as grandes cidades a investir em infraestrutura própria ou com parceiros públicos para atender pontos dispersos geograficamente, como escolas, postos de saúde e outras unidades de atendimento à população. E também a razão que movimentou pequenas cidades a construir suas redes, normalmente na tecnologia wireless, para levar sinal até os serviços que atendem à população.

Mas esta não é a única razão que movimenta os gestores públicos. Franklin Coelho, da cidade do Rio de Janeiro, conta que quando assumiu o cargo de secretário da Ciência e Tecnologia em 2010, o prédio onde está a secretaria C&T e abriga outras nove secretarias do município, no centro da cidade, era atendido por um link de uma operadora de apenas 2 Mbps. “Eram 2 Mbps para 300 estações de trabalho. Com nossa conexão à rede da RNP, hoje tenho na minha sala 10 Mbps”, diz ele.

Com sua rede própria, Campinas hoje entrega 1 Mbps full em todas as escolas e postos de saúde. E esse padrão, conta Ziller, também tem que ser atendido quando a rede é privada. “Saímos de uma velocidade real que às vezes girava em torno de 200 kbps para 1 Mbps de download e upload na ponta”, informa. Cobertura e velocidade também foram os fatores decisivos para Santos, no litoral paulista, investir em infraestrutura própria de 70 quilômetros que já conecta vinte das 80 escolas municipais. Mas ao contrário de Campinas, que compra rede das operadoras onde há oferta e entrega nas condições de qualidade de serviço especificadas, Santos quer atender todas as suas unidades com rede própria, de acordo com Ronaldo Vieira Lima, chefe do departamento de gestão de Tecnologias da Informação e Comunicações. Para isso, a cidade vai continuar expandido sua rede própria. “Falta qualidade à rede das operadoras”, reclama ele.

Ao lado da qualidade, pesa também a questão dos preços, elevados especialmente nas regiões da cidade onde não há competição, o que geralmente ocorre nas áreas mais periféricas. Segundo Renato Rodrigues, do ICI, um dos motivos de Curitiba investir numa rede própria de mil quilômetros foi reduzir o custo cobrado pelos links pelas operadoras. Outro, atender a projetos estratégicos da cidade, como o Sistema Integrado de Mobilidade Urbana, o Sistema Integrado de Videomonitoramento e Vigilância Eletrônica, a criação de uma Central de Controle Operacional do Trânsito e Transporte e da Central de Laudos de Exames Médicos Digitais.

Mas a redução de custo não é o motivo determinante do investimento em rede própria. É consequência, pondera Ziller. Com ele concorda Kulczynski, da Procempa. No caso de Porto Alegre, o fato de a empresa municipal de TICs ter assumido o serviço de voz fixa para toda a administração municipal resultou em uma economia de R$ 70 milhões a R$ 80 milhões ano. “Como somos uma espelhinho, com licença da Anatel, pagamos às operadoras que recolhem nosso tráfego valores de operadora e não de usuário final. E essa redução repassamos para a prefeitura, pois somos empresa pública”, diz ele.

 

 

Fonte: (wireless mundi)